Eu, Senhor, solteira? Elisabeth Elliot
Não
havia uma grande vista da janela. A principal característica eram as
lixeiras por trás da sala de jantar. As janelas fechadas não bloqueavam o
tremendo barulho no início da manhã... No entanto, fiquei muito feliz
por ter um pequeno espaço. Foi especialmente o que tinha desejado, e eu
finalmente consegui quando estava no meu último ano de faculdade. Tinha
uma cama, um armário, uma estante de livros, e no canto, perto da
janela, uma mesa com uma cadeira e uma lâmpada. Um lugar de silêncio e
solidão, um quarto do tipo que Jesus disse que nós entrássemos para
orar.
Eu
estudava e orava na mesinha. Havia árvores e um olmo velho atrás da
lata de lixo e eu me distraia, frequentemente, por causa da multidão de
esquilos que viviam lá. Assisti eles se preparando para o inverno,
rasgando de cima para baixo, freneticamente transportando provisões,
repreendendo, tagarelando, agitando suas caudas. Eu assisti as folhas
das árvores mudar de cor e cair, vi
a chuva cair e se assentar sobre a auto-estrada, assisti a queda da
neve sobre essas árvores e latas. Agora, quando sentarei à uma mesa
diferente daquela, para ler cartas de jovens confusos, eu vou me tornar
de novo naquela menina que olhava para a neve. O que eu usava não era
muito diferente do que usam agora... Eu tinha duas saias, três blusas, e
mais algumas blusas que fiz o meu melhor para misturar e combinar de
modo que parecesse que eu estava vestindo roupas diferente. Nas
quartas-feiras eram fáceis, pois todo mundo na classe usava o mesmo
blazer de lã azul com um emblema da faculdade costurado sobre o bolso do
peito.
Meu
cabelo me incomodava. Ele era loiro, não tinha nenhuma onda e crescia
cerca de uma polegada por mês. Como teria sido fácil usá-lo pendurado,
mas isso era impensável na época. Meus cachos eram todos “uma farsa”. Eu
só podia pagar uma permanente por ano, por isso, nos intervalos adotei o
antigo sistema, enrolando fios de cabelo em volta do meu dedo e a cada
noite antes de ir para a cama, prendia com um grampo. Se
eu não podia fazer muito com o meu cabelo, eu poderia fazer menos ainda
com o meu rosto. Como a maioria das garotas, eu desejava ser bonita,
mas parecia inútil mexer muito com o aquilo que me foi dado...
Naquele
ano eu precisava daquele quarto pequeno e acolhedor, talvez mais do que
nunca, haviam algumas questões que iriam definir o rumo da minha vida e
precisavam ser tratadas. Durante o verão passado eu tinha orado a Deus
para saber se eu seria ou não uma missionária... Cheguei a conclusão de
que foi Deus quem me chamou e que meu chamado era para a linguística
[Elisabethe estudou grego em Wheaton para traduzir o Novo Testamento
para língua dos nativos que ela evangelizou]. Pedi ao Senhor a
confirmação e obtive, então era isso mesmo.
Mas
havia outro assunto que não estava resolvido de modo algum. Deus sabia
que para esse assunto eu precisava de um lugar para ficar sozinha. A
questão era sobre estar sozinha para o resto da minha vida. Eu
perguntava: "Eu, Senhor, solteira?'' Essa questão parecia se meter entre
eu e os meus livros de texto grego quando me sentava à mesa, entre eu e
minha Bíblia quando eu tentava ouvir Deus falar. Era uma obstrução às
minhas orações e objeto recorrente em meus sonhos.
Eu
falava frequentemente sobre isso com Deus. Não me lembro de mencionar
isso a ninguém mais, por muitos meses. As duas moças que compartilhavam
comigo o quarto não eram um terço do tipo popular que causa inveja. Elas
eram tranquilas, meninas sensatas, alguns anos mais velha do que eu.
Uma era musicista que passou a maior parte do tempo praticando órgão no conservatório, a outra, uma ex-marinheira experiente em fazer meias de tricô no padrão argyle...
Após
a faculdade Jean casou. Bárbara ainda é solteira. Eu não me recordo de
nenhuma conversa com elas sobre amor e casamento (embora deve ter tido
alguma), mas eu estou perfeitamente certa de que para as três, a
solteirice significava uma coisa: Virgindade. Se você fosse solteira não
tinha que dormir com nenhum homem. Se havia de ser solteira
permanentemente, jamais iria para cama com um homem. [...]
A razão pela qual as minhas colegas de quarto e eu acreditávamos que solteirice era sinônimo de virgindade, não era porque éramos estudantes universitárias de cem anos atrás, quando todos acreditavam nisso. Não era porque não sabíamos de nada. Não era porque nós éramos muito ingênuas... Não era porque ainda não fomos “libertadas”, ou mesmo porque éramos simplesmente estúpidas. A razão era porque éramos cristãs. Valorizamos a santidade do sexo.
Sentei-me
naquela mesa junto à janela e pensei muito sobre o casamento. Eu sabia o
tipo de homem que eu queria. Ele teria que ser um homem que valorizava a
virgindade, tanto a dele quanto a minha.
O
que as mulheres querem hoje? O que os homens querem? Quero dizer, lá no
fundo. O que eles realmente querem? Se "os tempos" mudaram, também
mudaram os anseios humanos? E os princípios? Mudaram os princípios
cristãos?
Eu
digo não às três últimas perguntas, um enfático não! Estou convencida
de que o coração humano tem fome de constância. Há apatia, monotonia, e
tédio em tudo na vida, quando a virgindade e a pureza não são mais
protegidas e valorizadas.
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Elisabeth Elliot
Livro: Passion and Purity
(1º Capítulo condensado)
Tradução: Sara Abdala.
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